
Quem cresceu nos anos 80/90 deve se lembrar de quão ruim era a qualidade da televisão.
O sinal analógico era afetado por interferências, produzindo imagem inconstante, com os famosos “fantasmas” e “chuviscos”.
Era necessário algum tempo para sintonizar corretamente o canal e conseguir a imagem com a melhor qualidade possível (ainda que insatisfatória na maioria dos casos).
Uma árdua luta de seus dois a cinco minutos, ao final da qual, com muita sorte, a imagem estaria ao menos estável e poderia ser assistida.
Claro, se você ou outro membro da família resolvesse mudar de canal, a luta precisaria ser novamente recomeçada.

Meu pai sempre foi aficionado por obter a melhor imagem possível, então imagine a luta que era para poder assistirmos televisão em casa.
Ele ficava até quinze minutos tentando a sintonia perfeita na nossa antiga Telefunken de 12 canais.
Muitas vezes, quando ele conseguia a imagem perfeita, os comerciais já tinham começado ou até mesmo o programa acabara.
Essa busca incessante pela perfeição, no entanto, não é exclusiva da qualidade de imagem da TV (ou da obsessão do meu pai), ela é inerente a todos os aspectos do ser humano.
Tentamos sempre obter aquilo que há de melhor em qualquer experiência, mas precisamos adequar nossas expectativas à realidade.

Se você busca o seu parceiro ideal em um relacionamento (seja mulher ou homem), é necessário que você esteja disposto a abrir exceções para alguns defeitos, pois todos nós os possuímos.
Correr atrás da pessoa perfeita é um ideal inatingível, todo ser humano é, em essência, “quebrado” e imperfeito, incluindo você.
Se só o perfeito lhe agrada, acabará sintonizando a TV por sua vida inteira, sem nunca conseguir assistir os programas.
E se isto é uma verdade para relacionamentos e tantas outras questões, por que seria diferente nos jogos?

Vivemos em uma era dominada pela comparação de notas.
Assim que um jogo é lançado, as pessoas correm desesperadas para ver os reviews e esperam, ao menos, uma nota verde no Metacritic, ou seja, ao menos 75 de 100.
Abaixo disto, cancelamentos de pre-orders e xingamentos no twitter surgem, além de memes.
Só que estes 75 não são suficientes para a maioria dos jogadores.
Não senhor!
Precisamos de uma nota acima de 90 ou nem daremos atenção ao seu jogo!

O problema desta busca pela perfeição, é que no processo, boas ideias são ignoradas.
Jogos divertidos, mas que não atingiram o 90, são deixados de lado e muitas vezes substituídos por jogos com nota quase máxima, mas que possuem graves defeitos ou mundos vazios.
Porque jogos com gráficos incríveis ou franquias e marcas “protegidas” por uma “elite gamer” têm seu espaço garantido no topo.
Bugs tornam-se engraçados nos jogos da Rockstar, bugs estes mesmos que, em um jogo da Ubisoft, seriam motivo para reclamações por semanas, ou até meses.
E é claro, os fanboys estão preparados para cada lançamento.
Eles vão elevar as notas de sua empresa favorita e destruir as notas da concorrente.
Quando exclusivos da Sony ou Microsoft são lançados, há legiões de soldados esperando para duelar, caçando glitches para postar como o gráfico real do jogo ou imagens maquiadas e até trailers de anúncio para enaltecer o poderio de seu console.

A luta pela perfeição e pelo pódio ignora uma massa de outros jogos, ideias divertidas, inovações de gameplay ou tramas profundas, que não receberam tanto polimento e amargam o esquecimento.
Porque a atualidade dos jogadores, influenciados pela internet e sites especializados, é contar pixels e analisar cada textura possível, esquecendo outros aspectos dos jogos lançados.
O trem do hype é tudo que interessa, você precisa subir nele o quanto antes.
Como já dizia, ainda 400 a 300 anos a.C., o filósofo Aristóteles: “A perfeição é o meio-termo entre dois vícios: um por excesso e o outro por falta.”
muito bom o texto, recomendo muito ler, se vc chegou ate aqui embaixo so olhando as imagens.